quinta-feira, 6 de julho de 2006

Refação

Lu Minami

Ouvindo: qualquer coisa do Leonard Cohen, prá doer de verdade.

Todo ano eu passo por algumas semanas de "refação". É, como em propaganda. Não tem campanha que precisa de refação? Eu também preciso.

Passo algumas semanas mais sozinha, mais concentrada em mim, esquecendo um pouco da dor dos outros, olhando para meu umbigo que estufa por causa das células gordas ao redor. Tem gente que me conhece há tanto tempo que nem percebe mais. Acho que se acostumaram.

Mas o fato é que eu canso. Eu chego num ponto de impaciência com o ser humano e suas besteiras. Eu alcanço um degrau acima para olhar para todo mundo e dizer: Seu bostinha! Não quero mais sua verborragia ou a falta dela. Não tolero mais essa sua incompetência para sentir e falar o que pensa e assim, sentir e falar tudo errado. Não suporto mais esse rótulo que você carrega na bolsa e mostra para quem quiser como se fosse uma insígnia da polícia. Não consigo mais sorrir de mentira, dizer doçuras, quando na verdade a única coisa que preciso é olhar duro nos olhos e dizer que não, eu não gosto mais.

Esse estado de fúria e rancor é rápido, quase não dá para descrever porque em seguida, mergulho em outro lugar. Começo a pensar se o mundo que vivo é de verdade. Se minhas ações, palavras, pensamentos e sentimentos são realmente sinceros. Fico pensando se não sou condicionada ou manipulada o tempo todo. Fico imaginando se o acaso existe mesmo ou se tudo faz parte de um suposto destino, entrelaçado em cada dia da minha vida, cada pessoa que cruza meu caminho, tudo que ouço, vejo, pego, cheiro. Meu estado de confusão permanece por mais tempo. Me vejo no trânsito olhando para o meu reflexo misturado com os outros rostos apáticos de São Paulo. Será que não é apenas um retrato? Uma foto tirada as pressas, que monta um álbum de fotografias sem importância?

Quando fico confusa demais para distinguir um semáforo de uma foca, entendo que é preciso racionalizar. Penso nas razões que me levam a sair da cama quente todo dia e alcançar o despertador do outro lado da cama, gelado. Me pergunto se vale a pena ter uma cama tão grande e um despertador tão barulhento. Faço tantas perguntas que as respondo com mais perguntas. Quero descobrir em 10 minutos porquê existo. E, antes de entrar numa convulsão cerebral, me agarro numa resposta simples e emocionada.

Vivo porque é preciso. Vivo por causa de todos os clichês que já vivi e os que ainda estão para chegar. Vivo por causa de todas as bizarrices que presenciei e por todas aquelas que ainda se levantarão na minha frente. Vivo porque a felicidade só acontece quando se sabe o que é estar triste de verdade ao ponto de dormir desesperada e acordar chorando. Vivo porque a tristeza, a decepção e a desilusão são capazes de desembaçar meus olhos. Vivo porque compreendo e sou incompreendida e vice-versa. Vivo porque todo ser humano precisa sentir a liberdade, mesmo que por algumas semanas. Esta razão me basta.

E então, desço daquele degrau e volto para o degrau que me pertence nesse enorme latifúndio.

3 comentários:

ju e lu [e vice-versa] disse...

Já voltou pro degrau?

ju e lu [e vice-versa] disse...

of course, my horse... :o)

Anônimo disse...

A srta. Mancin abandonou o blog?

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