quinta-feira, 27 de abril de 2006

Conto sobre descartabilidade

Lu Minami

Ouvindo: Agoraphobia, Incubus

"Sou fast food"

Ele levantou-se da lanchonete e foi embora. Pensou no quanto sua vida era estúpida. Imaginou lugares que poderia ter visitado e que só havia visto em guias de viagem, cadernos especializados no jornal. Material para compor sua personalidade. Senão, o que diria quando lhe dissessem: "Fui à Patagônia no último inverno. É simplesmente sublime.". Ele sempre responde: "Ah, o gelo... exerce um poder fascinante não é? Você não se sente pequeno perto daquelas monumentais paredes brancas quando chega perto de Perito Moreno?".

Está feito. Nada que uma passada de olho por cima da capa da revista sobre turismo sul-americano não resolva. Bem, ele sabia mais do que as pessoas que estiveram lá. Colhia informações sobre tudo o que havia para se tornar magnético em seus artigos, essa é uma boa palavra. Mas faltava algo. Faltava estar lá, é claro. Fazia-lhe falta o cheiro do gelo, as pedras no chão, o céu infinito, o medo de cair na água gelada e morrer.

Quando pequeno, haviam centenas de milhares de possibilidades para ele. Quando adolescente, estas possibilidades praticamente dobraram de tamanho e a juventude e a sensação de que o mundo inteiro poderia caber no seu peito latejava forte dentro de suas veias. Ele poderia ter partido. Poderia ter feito jus a nome que lhe deram de batismo. Mas daí chegaram-lhe os anos. Alguns mais curtos, outros longos demais. Quando percebeu, estava ali, sentado, com uma única possibilidade: escrevia artigos sobre turismo local e dava dicas de viagem.

Enganava bem. Nunca havia sequer saído da cidade, que dirá de seu país. Tinha medo de avião e passava longas temporadas em sua casa no campo, para que todos na cidadezinha achassem que ele, o cidadão mais viajado do mundo e que recebera a chave da cidade há 4 invernos, estava em uma de suas gloriosas aventuras pelos hemisférios.

Entre o trópico de capricórnio e de câncer. Linha do Equador. Marco zero. Havia se acostumado com o fuso horário através das contas que fazia. Combinava as datas, o tempo dos vôos, a condição climática e sabia dizer exatamente a que horas chegara em Budapeste na terça-feira passada. Aprendera a mexer num programa de computador que lhe permitia manipular as imagens, inseri-lo numa paisagem, sem que soasse artificial. Mandava emails semanais para seu editor com as fotos e a descrição exata do que acontecia em Estocolmo. Cinco dias depois, em Verona.

"Ainda tem problemas com o fuso?"
"Sim, tenho. Mas em Pequim, a cidade não dorme e lá existe uma loja com uma variedade imensa de chás para qualquer mal, inclusive insônia no fuso horário"
"Pequim, hein?"

Pois é. A internet, os jornais, as revistas especializadas, a TV a cabo. Tudo lhe fornecia material para suas pesquisas, seus artigos cheios de paixão sobre Cuernavaca no México e sua culinária, a dança típica e os seresteiros que cantavam para casais enamorados numa névoa amarelada típica da iluminação da cidade. Cuernavaca era quente e abraçava todos os turistas com seu jeito caloroso, suas flores e pessoas coloridas.

Mas era sabido. As pessoas o consumiam pela mesma razão. Queriam saber sobre um mundo que não cabia dentro de seus seus planos. Mas de nada adiantava. Ele lia, se informava e tomava propriedade de informações que depois dizia serem suas e as pessoas o consumiam. Mas depois o esqueciam pois a vida na cidade precisava de comida e contas de luz e água quitadas todo mês. Ele era descartável e não fornecia nutrição alguma.

"Fast food", repetiu consigo mesmo.
E jogou fora seu cachorro quente gelado.

quarta-feira, 26 de abril de 2006

Onde arrumar inspiração?

Lu Minami

Ouvindo: Why does my heart feels so bad?, Moby.

Não deveria ser difícil arranjar inspiração num mundo como o nosso. Eu preciso de um motivo para escrever neste blog e posso nomear vários. Eu poderia falar de livros, discos, histórias bizarras que só acontecem na minha presença, amores errados, novas tecnologias, as eleições, futebol, orkut, enfim! Dá para ensaiar horas sobre um mesmo tema, apresentar argumentos e visões diferentes. O problema é justamente esse: há muito o que dizer. Mas também há muitos canais de comunicação para ler, ouvir, assistir, participar. Me vi hoje pensando: "O que eu poderia escrever no blog?"

Minha inspiração hoje se baseia nela mesma. Quando falo de amores errados por exemplo, - justifico minha escolha porque só conheço essa modalidade - vou direto ao jeito chicobuarquiano de ser. Falo dos males e não somente das flores. Gosto do lado sujo, obscuro, traidor, mosntruoso que o amor esconde debaixo daquela aura de paixão ardida, beijos eternos, abraços do tipo cobertor. Cansa. A perfeição cansa. No entanto, a imperfeição é sempre um desafio que deve ser desvendado mesmo que caia novamente na primeira frase a ser pensada a respeito: estou apaixonada. Me deparo então com outro problema: como não soar redundante?

Por isso admiro o único. A situação que você vive, ninguém mais vive igualmente a você. Por isso talvez valha a pena compartilhá-la com outras pessoas. Tudo deveria servir de material para reflexão, mesmo que por poucos segundos.

Também adoro a casualidade. Admitir a remota idéia de que existe algo chamado "predestinado" me deixa um pouco apavorada. Então, simpatizo com a idéia de topar com um livro sensacional, um disco sublime, uma notícia realmente boa, um amor inesquecível por puro acaso (do destino? rs...). Bem, é assim com a inspiração, mas pode e deve ser treinada e acessível.

A última coisa que quero é que esse post soe desesperançoso. Não é para ser. É um "Atenção" em letras vermelhas, mas não garrafais, porque não gosto que gritem comigo e suponho que vocês também não. É só para lembrar que a inspiração deve ser cultivada. Seja num sorriso ou numa lágrima. Numa desavença ou num encontro feliz. No azul da manhã ou no vermelho do crepúsculo de todo dia. Na casualidade ou numa situação esperada. Eu preciso praticar mais a minha.

A apatia é a última coisa de que precisamos.

quinta-feira, 20 de abril de 2006

Entrelinhas II

Lu Minami

Ouvindo: Sinal Fechado, Chico Buarque.

Em homenagem às entrelinhas, uma canção do mestre basta.

– Olá! Como vai?
– Eu vou indo. E você, tudo bem?
– Tudo bem! Eu vou indo, correndo pegar meu lugar no futuro... E você?
– Tudo bem! Eu vou indo, em busca de um sono tranqüilo... Quem sabe?
– Quanto tempo!
– Pois é, quanto tempo!
– Me perdoe a pressa... é a alma dos nossos negócios!
– Qual, não tem de quê! Eu também só ando a cem!
– Quando é que você telefona? Precisamos nos ver por aí!
– Pra semana, prometo, talvez nos vejamos... Quem sabe?
– Quanto tempo!
– Pois é...quanto tempo!
– Tanta coisa que eu tinha a dizer, mas eu sumi na poeira das ruas...
– Eu também tenho algo a dizer, mas me foge à lembrança!
– Por favor, telefone
- Eu preciso beber alguma coisa, rapidamente...
– Pra semana...
– O sinal...
– Eu procuro você...
– Vai abrir, vai abrir...
– Eu prometo, não esqueço, não esqueço...
– Por favor, não esqueça, não esqueça...
– Adeus!
– Adeus!
– Adeus!

No ORKUT

Nosso blog tá no ORKUT, o link tá ali embaixo.

Tanx Karú!!!

quinta-feira, 13 de abril de 2006

Devaneio

Jú Mancin



Ouvindo Pearl Jam, o novo album do Pearl Jam (na íntegra)

***meus novos amigos não sabem, mas são personagens inseridos nas lendas do meu Jardim Secreto. São, definitivamente, meu eterno carnaval***

www.batatadoce.com.br

terça-feira, 11 de abril de 2006

E nas entrelinhas...

Jú Mancin


Ouvindo Foi um rio que passou em minha vida, Paulinho da Viola

- Oi!
(eu te amo!)
- Oi!
(eu também!)
- E aí, como cê tá?
(Já desencalhou ou ainda me espera?)
- Ah, tô legal, trabalhando pacas
(Não, não. Ainda te espero. Vai demorar?)
- Poxa! Bom te encontrar, faz tempo que a gente não se fala.
(Foge comigo?)
- É mesmo, né?! Parece tão difícil a gente se encontrar.
(AGORA!)
- Ih! Peraí. Meu celular tá tocando...
(essa conversa já tá disvirtuando)
- OK!
(salva pelo gongo, ou pelo RingTone)
- Putz, tenho que ir. Fiquei com a chave de casa, e minha mãe tá trancada pra fora. Que pena!
(CARALHO! É sempre assim!!!)
- Pena mesmo!!! (mãe filha da puuuta!!!) Então a gente se vê...
(EU TE AMO!!!)
- É né?! Até a próxima!
(EU TAMBÉM!!!)

segunda-feira, 10 de abril de 2006

Alucinações...

Lu Minami

Ouvindo: I got Id, Pearl Jam

Era uma chance em mil. Haviam muitas pessoas envolvidas, algumas dezenas de sentimentos mal sentidos, mal percebidos. Algumas eram apaixonadas, outras ainda não sabiam direito o que eram e achavam que havia tempo o bastante para descobrir. Como quando eram crianças. Tudo era cedo demais.

Mas daí, ele apareceu. Primeiro numa foto, para que ela pudesse saber que aquilo era exatamente o que ela não procurava. Mas fixou suas duas pupilas naquelas que eram amarelas e olhavam diretamente para ela, que desviou o olhar da foto. Depois, ouviu falar dele. Também não gostou, o achou pessimista demais e para ela, já bastava si mesma. Daí, por ironia do destino, um dia cruzou com ele numa avenida. Coisa clichê, dessas que dão vontade de pregar no meio de um filme porque combina. Mas ele não a viu, passou apressado com um casaco pesado e marrom, num calor de 30 graus e cabelos molhados. Na última vez que o encontrou, ele acenou com a cabeça e ela não soube olhar. Quando ele se afastou ela desejou nunca o ter visto e, ao mesmo tempo, nunca ter perdido aquela oportunidade de ouvir a voz dele.

Ela ficou desnorteada e não quis mais pensar naquele homem que a perturbava. Ela não entendia porquê, mas quando pensava nele, queria se jogar de um precipício e morrer, era doentio. Ela sentia frio e seus passos não cabiam mais em seus pés.

Quando ele ameaçava encontrá-la, numa esquina, num cruzamento, num cinema, ela desviava sem saber e ia para outro lado. Evitava um encontro inconscientemente. E toda vez pensava nele com medo e sabia que aquilo poderia machucar uma meia dúzia de pessoas.

Será que há como fugir de alguém assim? Será que existem meios de fugir de uma história perigosa e decadente? Talvez... uma chance em mil.

quinta-feira, 6 de abril de 2006

Outro diálogo

Lu Minami

Ouvindo: Desentoa, Cachorro Grande

- Foi legal te ver ontem.
- Legal
- Sério. Fazia muito tempo que a gente não se via, Lu... desde... janeiro?
- Não sei, não lembro.
- Quem era aquele cara bacanudo que estava com você?
- Faz alguma diferença?
- É claro que faz, eu ainda me preocupo com você.
- Hum. Bom, na verdade... não me leva a mal, mas não te interessa.
- Nossa, porque a estupidez?
- Só estou sendo sincera. Não te interessa quem é o cara que estava comigo ontem. Sério.
- OK. Entendi. Mas pelo menos somos amigos, né?
- Amigos? hahaha... Escuta, o que você está querendo? Massagem no ego ou dormir tranquilo com a sua consciência? Eu não sou uma pessoa que tranquiliza as outras, então... Não, negativo, não somos amigos, nunca fomos amigos e nunca vamos ser amigos.
- Mensagem recebida, Lu. Não vou mais te encher.
- Puxa, jura mesmo? Eu estava me perguntando se havia meios de me fazer mais clara que isso.

(Fecha para o meu rosto, fazendo cara de dãããã e fingindo atolar um sorvete na testa. )

Juro, eu adoro ser curta e grossa com quem merece.
E, juro... eu adoro mais ainda ser curta e grossa com quem merece nesses meus diálogos imaginários.

(Bacanudo foi foda...)

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