Lu Minami
Ouvindo: Bottle It Up(Sara Bareilles)Foi contagiante. Alguma coisa que me obrigou a sorrir, a estar feliz ou pelo menos, aliviada. Acho que você me cutucou, deu um tapinha no meu braço debochando da minha falta de graça.
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E eu me achando tão séria, já que tinha quase uma década de anos a mais que você. Eu ali, com o corte novo do meu cabelo a cor nova que pintei, o vestido novo, a pele cheia de sol. Achando que o toque da minha mão no seu ombro já faria você quase terminar a sua noite. Um beijo, então... achei que correria até o banheiro para disfarçar essa coisa de homem em pele de menino.
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Mas aí você soltou uma risada. Dessas redondas, de quem ri com o corpo todo, sacolejando bonito e despreocupado. Você é clichê com a camisa rosa e o cabelo caindo. Até seus olhos verdes são esperados.
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Não quero clichê. Mas aí me lembro que não quero clichê chato, triste, solitário. Não quero guarda chuva vermelho na multidão cinza, cantoria sozinha no meio da avenida, mirada para as estrelas em noite quente, pensar em alguém que não se pensa faz tempo e chorar de raiva, bola de feno em dia cinza, encontrar aquela poesia na capa de algum livro de sebo, essas coisas.
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Não quero.
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Quero clichê feliz então.
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De beijo na chuva, carro conversível na estrada com echarpe voando, campo de trigo em dia de sol, piquenique com toalha xadrez vermelha, mão dada no parque, dormir na sombra de um salgueiro numa tarde abafada, amor que dá certo.
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Nesse clichê todo então, eu te proponho uma troca. Peço como quem não sabe pedir e então peço com os olhos. Te dou um riso e um beijo e você me dá essa calma alegre que você tem, que parece acabar com qualquer tormenta só de olhar. Me lê de vez em quando, não precisa ser sempre, para você não ter essa certeza de que sou uma moça triste. Briga comigo quando eu não estiver sorrindo com você, me abraça sem motivo, assim no meio de todo mundo, no meio do mundo. Me liga, diz que morre de saudade enquanto eu morro um pouco toda vez que você disser isso. Me manda cartas, mensagens, emails, cheios de promessas que não vai cumprir e que eu não sei dar valor. Senta do meu lado e pousa sua mão sobre a minha. Deita comigo e pousa tudo que você sente aqui dentro de mim. Ouça minhas bandas, leia meus livros. Eu não vou ler e nem ouvir as suas e os seus, mas vou dizer que sim e você vai acreditar. Me dá um pouco de você, dessa janela escancarada que você conserva para o mundo inteiro, me enche desse exagero, esse muito-mega-master-super que você tem com tudo e todos. É só isso, menino. Só isso que eu quero.
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E em troca te dou um punhado disso tudo que pulsa aqui dentro sem serventia alguma, esse humorzinho difícil, esse mimo orgulhoso, essa mania de perseguição, essa vontade de pular em cima da cabeça dos outros, para tomar posse ou para destruir mesmo. Essa lama que fica se mexendo no meu estômago, que bloqueia a minha garganta e tapa meus ouvidos. Te dou minha insônia, onde podemos preencher com coisas minhas desesperadas e coisas suas, sempre leves. A gente vai caminhar pela chuva, pelo centro da cidade e eu vou te mostrar que na feiúra tem tudo de mais lindo, sem o vazio constante dos parques de diversão que você está acostumado. Eu vou ler para você a indiferença de Camus, o cru esbofeteado de Henry Miller e a saudade de Neruda. Vou assistir com você uma violência despudorada, cheia de coisas sem significados e que parecem tão importantes e que na verdade, nada são. Eu vou te mostrar um monte de gente grande e amargurada que fica assim porque um dia olharam para si no espelho e disseram: A vida é dura. Te dou um pouco disso tudo que é meu, você quer?
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Você riu de novo, abriu os braços e me encaixou bem ali no seu peito, fazendo eu não me sentir pequena e maluca, mas fazendo eu me sentir do tamanho certo que eu devo ter, no meio dos seus braços e de um coração que eu já desconfiava ser grande demais. Grande demais.
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Porque como todo clichê e como todo menino diz:
As coisas acontecem como devem ser.