Lu Minami
Ouvindo: Eu preciso dizer que te amo(Cazuza e Bebel Gilberto)É fácil perder a conta de quantas bocas já conversaram dentro de mim, falando o que fosse, pedindo o que fosse. Para falar a verdade, nunca me preocupei em contar... talvez só os primeiros. Depois, conto com a memória do gosto e da dor que ficam. Neste mês, faz alguns anos do último que arrancou metade de mim e jogou longe, num triturador. Eu me lembro da fila para estacionar, do vestido e das botas que eu estava usando. Eu lembro do sorriso e do barulho do gelo tilintando no copo, misturado à voz da Luana Piovani que abriu a festa. Nunca gostei dela. Não sei porque lembro dela nesta ocasião. Tinha gosto de vodka gelada e de cigarro, num calor exasperado que quase me lançou ali de cima, daqueles parapeitos onde a gente ficou horas admirando um jardim.
Dali para frente lembro de todas as chances que eu tive de falar e você de ouvir. E das palavras que eu deveria ter engolido ao invés de depositá-las na mesa daquele mesmo bar que a gente fechou tantas vezes, desnudas, para que você pudesse contemplar num sorriso bobo que na verdade escondia alguma coisa que antes eu achava ser cinismo e hoje eu acho que era simplesmente o não saber o que fazer comigo. Tão nova e tão boba, esperando o menino que ela escrevia em seu diário, como príncipe que poderia chegar num castelo como aquele da festa.
O tempo todo que tivémos depois, aqueles meses e semanas que poderiam ser descritas um por um, porque eu me lembro de absolutamente tudo, me trouxe um espasmo de dor que nunca passou. E eu sofri de um jeito por alguém que nunca mereceu como ninguém. Sofri loucamente, drasticamente e tragicamente como num último capitulo de novela mexicana, sem a parte feliz. Aquela dor clichê que o mundo diz o mesmo ditado sobre o tempo e sobre merecer, aos quais eu respondia “que se foda, tô sofrendo prá caralho” ali, dentro de mim, do meu quarto de luz apagada e debaxo dos lençóis, desejando estar em alta velocidade para encontrar um poste logo.
Estamos fazendo aniversário, daquele dia e do tempo que você não está mais na minha vida contra a minha vontade. Vai ser sempre contra a minha vontade, como sempre.
Mas você sabe que esses podem ter sido os melhores presentes que alguém já me deu? O primeiro e o último dia como presentes...
Agora, se você me der licença, com toda a educação, eu vou procurar a outra metade triturada, que a essa altura já deve estar sentindo a minha falta, mesmo contra a vontade.