quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

.amor.ideal.

ju mancin

d °_° b último desejo, noel rosa

e a vida velha finalmente volta a respirar.

a única que me inspira a abrir o coração e deixar jorrar o sabor agridoce de um amor ideal.

nunca houve amor maior. nem menor. porque de fato, nunca aconteceu. seus olhos que nunca me viram e suas mãos que jamais me tocaram…

o odor inebriante de um amor ideal.

meus versos prenderam-se ao papel e deixaram em branco aquela carta que nunca mandei. das tantas que escrevi…

seus dedos finos dedilham num piano velho as poucas e raras notas de um samba chorado. tão triste quanto o amor, aquele ideal.

e meus olhos se escondem atrás dos olhos de alguém que não te quer, amor ideal.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

amor

Lu Minami

Ouvindo: Volver
[Carlos Gardel]

Era demais, como nunca talvez tivesse sido. Olhares que se encontravam, mãos que retorciam uma nas outras procurando calejar as linhas cansadas da vida, acabar logo com aquilo. Ela ficou um tempo olhando a noite que abraçava a cidade num céu rosa alaranjado e quente, quase amável... para se tornar em seguida negro e cheio de promessas vãs. Pensou, amou com o peito que doía aquela história que tinha acabado. E ficou com medo de amar a próxima. Olhou de novo para ele, do outro lado da sala, que arrumava um disco apropriado para ela. Ela pensou: Ella. Ele pôs Louis. E o pavor tomou conta de cada célula que tremia de frio e pedia um abraço forte que a envolvesse até o ar acabar e o mundo voltasse a ser o que era antes, tóxico e morto, prestes a criar vida novamente. Era mais fácil dizer que gostava de Duke então. Mas isso só faria com que ele a quisesse mais ainda. E se ela batesse nele? Eles se amariam na fúria do outro. E se ela contasse sobre o outro? Ele nada diria e a beijaria, sua nuca ficaria arrepiada e ela ia sim se entregar, sem dó nem piedade de si mesma. Bastava dizer que odiava aquele quadro e ele o tiraria da parede para sempre. E se citasse que o amor era liquido e efêmero, ele a possuiria mais forte e intensamente do que nunca. Se ela pisasse no coração dele, miúdo e despreparado, ele jamais a deixaria. Se ela fosse embora, ele iria atrás.

Então ela disse: Eu te amo. E tudo acabou. 

terça-feira, 26 de outubro de 2010

.adeus.

jú mancin

d°_°b leave, R.E.M.

uma lágrima mancha a tinta azul que marca o papel. uma única e silenciosa lágrima, quase secreta, que escorre devagar, entre os poros e desaba em queda livre.

saudades do que quase não aconteceu. uma a uma, letrinhas enfileiradas desenham uma história do acaso. mais uma das tantas que o destino insiste em me presentear. uma boa história, contada em segredo,e guardada num baú de relíquias, junto das memórias de uma vida que não tive.

um cigarro a mais queimando no cinzeiro, enquanto no copo suado, o doce veneno me espera, para verter amargura em poesia. nem sempre funciona.

lá fora, a noite alta corre para os braços da alvorada. é a vida caminhando à passos largos. da janela vejo os pingos da chuva, escorrendo na vidraça. o céu chora minha saudade dessa vida que não vivi.

sinto que devo seguir. sem olhar para trás. esquecer. calar de vez essa voz, que não é minha, que dita as regras ao meu coração emburrecido pelo culto aos romances de bancas de jornais.

quero partir. [quem partiu meu coração] e entristeço quando reconheço; fui eu mesma quem deixou.

quero partir para longe de mim, num trem com grandes janelas, que me permitam ver a paisagem deixada para trás. a paisagem & seus olhos, num adeus silencioso, como a nossa história, que em segredo, nunca aconteceu.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

.perdi.

ju mancin

d °_° b dear prudence, the beatles

sinto algo triste rondando minha alegria, algo maior do que o meu sangue frio suporta e sinto medo da tormenta que se aproxima.

impotência. como se minhas mãos estivessem atadas.

fui além de onde deveria, ultrapassei a barreira do bom senso, dos bons modos. quebrei a regra da minha boa conduta e deixei fluir segredos em veias mansas. despertei de um sonho ruim e calmamente me libertei das sombras de um fantasma.

rodou.mundo.rodou.gigante. e eu, permaneci parada, em completo deleite, observando a dança sexy da tempestade que se aproximou. abri a janela para encarar o caos. gostei dos olhos. gastei meu tempo. perdi as forças…

hoje, me encontro na velha varanda silenciosa, sentada na velha escada de madeira, tendo um cigarro como companhia, ouvindo o chiado da vitrola velha, que grita com certa angústia a dor de um velho poeta, que trocou o amor por um par de chinelos velhos. perdi!

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

.33.

jú mancin

d °_° b touch me, the doors

como começar um post depois de perder a mão de escrever, a inspiração e a linha?

esse deveria ser um post falando de mim, ou para mim, tentando explicar a mim mesma de onde brota tanta ausência. eu poderia começar dizendo que sou isso ou aquilo… e falar das coisas que não quero ser, poderia dizer que vejo o mundo com os olhos de um poeta e ouço, atentamente, a cada um dos sussurros que me sopram aos ouvidos… e dizer que sinto na carne o pensamento dos que me cercam.

se eu fosse séria, diria também das coisas que não admito: olhar nos olhos e não enxergar a alma, vida vivida pela metade, sangue morno e caretice. poderia falar que entre as coisas que não quero ser, a que mais me assusta, é escrava da moral e dos bons costumes, não por rebeldia, mas pelo simples fato de estar em luta comigo mesma, para tornar-me quem eu sou e dar vida ao meu mundo, que se agita com força atrás destes desta cortina que vos escreve, um mundo livre, que permite toda e qualquer loucura, desde que salvem-se todos entre os mortos e feridos.

mas eu não sou séria e algo me diz que nas próximas cinco linhas vou perder o raciocínio que me trouxe até o moleskine…

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perdi o foco, mas isso já não me assusta mais, sofro de TDAH [transtorno do déficit de atenção e hiperatividade]. hiperatividade cerebral é veneno pro meu corpo mole. eu penso, penso e penso, logo desisto e não saio da inércia. uma pena pra mim e tremenda sorte pra vocês, que nunca saberão da capacidade que uma mente atormentada por 33 anos de puro ócio, tem para pensar bobagens, sacanagens, maldades, safadezas e afins.

o fato é que precisava encontrar um meio de começar a falar. estou atolada na vida, bem aqui, do alto dos meus mal dormidos 33, e precisava respirar…

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Ternura e Tempo

Lu Minami


Ouvindo: Último Romance (Los Hermanos)


É só com você que minha inspiração volta. Brota devagar, num sorriso estranho que não quer aparecer, mas faz crescer o brilho nos olhos. Ouvir sua voz e sua risada me fazem querer escrever, cantar e dançar. Clichê? E apesar do tempo ter corrido e das nossas primeiras rugas terem aparecido e da vida que seguiu seu rumo sem pausa para os olhos e para o coração; apesar de tudo isso, eu ainda sinto o tempo se acertar quando conversamos destemida e profundamente. Depois de tanto, a minha serenidade. Depois de tudo, a sua sinceridade. Se o amor é assim, eu já o conheço em você. Ouço o que convém, digo e calo o que incomoda, vejo só o que meu peito permite e meu corpo sente só o que emociona. Com você por perto, os objetos pelos quais sou obcecada se aquietam e vão embora, sabendo que perderam a batalha. Com você, eu entendo o tempo e a calma. Sem espera e sem descontrole. Só isso tudo que preenche minhas lacunas que ninguém conseguiu chegar perto o suficiente para transbordar. É seu, propriedade privada que leva seu nome e meu amor. Um presente meu que te devolvo, que você me deu tanto tempo atrás. 

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

.eu sabia.

jú mancin

d°_° b no surprises, radiohead

a gente sabe. a gente sempre sabe…

o que nos mata e o que nos fortalece.

eu sabia que ficaria em silêncio de novo, que aquela estrela me calaria. eu sabia do medo que, ora ou outra eu ia sentir e que numa dessas madrugadas e meia, eu choraria em segredo a solidão do mundo, escondendo os olhos no travesseiro. sabia que flutuaria numa manhã ensolarada e sorriria, agradecendo ao cosmos por mais um dessas brincadeiras que acabam se tatuando em mim. sabia da ânsia que ia sentir por uma dose a mais e da amnésia que apagaria meus piores pesadelos. eu sabia que mais uma vez, não seria pouco isso tudo que berra aqui dentro e sabia que seria difícil dissimular. sabia de tudo quando me sentei na pontinha do penhasco para ver a vista lá embaixo. sabia até que me encantaria a queda, assim como eu sabia que minhas asas não seriam suficientes e que meu pára-quedas poderia não funcionar, assim, tão bem. e sabia que aquilo tudo, uma hora seria nada. [porque esse é assim que as coisas são]. eu sabia até que hesitaria por medo da queda e me trairia logo em seguida, porque também sabia que o medo não valia a pena. a verdade é que eu sabia e mesmo assim sorri pro destino e deixei o barco correr…

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

...

Lu Minami

Ouvindo: Wild is the Wind (Nina Simone)


Eu sabia, estava entrando na fase. Os sinais começavam a ficar claros e as pessoas amáveis ao meu redor se preocupavam e me cercavam junto com seus cônjuges também amáveis que ligavam e queriam saber mais. “Tem algo errado com ela, ela está triste, o que ela tem? Será que é de novo o cara? Odeio quando ela começa a falar e perde o olhar no teto. Definitivamente tem algo errado”. Eu sabia da fase porque estava começando a olhar com aflição os meus pés e pensava nas pequenas rugas que começavam a aparecer. Eu sempre penso que rugas nos pés só valem se eles estiverem velhos de tanto andar. Eu andei bem pouco nessa vida. Eu sabia porque algo começava a se alastrar em mim como uma idéia genial que ninguém nunca teve. A barriga contorcia e tinha espasmos gelados junto com a minha neurose e minha timidez, tudo misturado com o calor que invadia minha garganta. Eu sabia que estava entrando na fase porque minha voz estava falhando, como quem parece ter gritado a noite inteira ou então como quem permanece dias e semanas em silencio. Eu sabia porque minha boca estava reta, numa linha fina e seca e eu só conseguia passar a língua sobre os lábios para fazer rachar e sangrar. Eu sabia porque começava a esquecer nomes de coisas e pessoas porque elas iniciavam o processo irremediável do tempo, onde deixam de ser realidades para se tornarem memórias. Eu sabia porque permanecia em silêncio nos meus diálogos internos, como quem pondera e avalia, pesa e pensa a respeito. Eu sabia porque as cores começavam a adquirir tons estranhos e confusos e as pessoas começavam a ficar pálidas, como os vídeos da infância. Eu sabia porque meus cotovelos estavam duros demais, como quem aprende um só golpe de defesa durante toda a vida. Eu sabia porque estava ouvindo muito mais jazz do que antes na tentativa de ajustar meu ritmo e torná-lo universal. Eu sabia porque pensava em tatuagens e colorações de cabelo para fugir do reflexo antigo de mim mesma. Eu sabia que estava entrando na fase porque o encanto acabou e ninguém conseguia me manter por perto por muito tempo. Eu sabia porque quando andava, me perdia. Eu sabia porque quando dormia, sonhava longe. Eu sabia porque a graça não estava mais comigo; sem graça, sem amor, sem paixão e sem desejo. Eu sabia porque meus olhos estavam desconfiados no espelho. Eu sabia porque o peito calava e as pernas tremiam. Eu sabia porque minhas mãos me encaravam o tempo inteiro e me cobravam uma atitude, um gesto. Eu sabia.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

.embriagai-vos. [dandys do mundo, uni-vos]

ju mancin

d °_° b so what, miles davis

É necessário estar sempre bêbado.
Tudo se reduz a isso; eis o único problema.
Para não sentirdes o horrível fardo do Tempo, que vos abate e vos faz pender para a terra, é preciso que vos embriagueis sem cessar.
Mas de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, a vossa escolha.
Contanto que vos embriagueis.
E, se algumas vezes, nos degraus de um palácio, na verde relva de um fosso, na desolada solidão do vosso quarto, despertardes, com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, perguntai ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai-lhes que horas são;
e o vento, e a vaga, e a estrela, e o pássaro, e o relógio, hão de vos responder:
É hora de se embriagar!
Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos;
embriagai-vos sem tréguas!
De vinho, de poesia ou de virtude, a vossa escolha.

C. Baudelaire

terça-feira, 29 de junho de 2010

.de.caso.com.o.caos.

mademoiselle marchand

d°_°b fire, jimi hendrix

depois de algumas doses fica tudo tão claro.

um cigarro queimando no cinzeiro, o copo suando algo entre o mel e o fel... a mente vaga entre dois, talvez três, mundos... sem espaço para o que é real...

a chuva que bate na vidraça musicalmente deixa no ar um cheiro fresco de mágica que está por vir. mágica que se desenha no ar, entre nuvens de fumaça que vagueiam rubro-verdes.

a indescritível mágica das sombras. paixão ou algo mais. o mistério de olhos que estranhamente me seguem no escuro. olhos que, para meu absoluto deleite, me desejam no escuro.

bocas que se tocam, mãos que se beijam. sussurros entre silêncios.

te quero!

como um gato à minha espreita no breu da noite…

não te esperava assim de repente.

era esse o momento de me guardar. de me acalmar. meus cigarros não são tantos assim.

eu não quero querer o que não devo ter. busco em mim, algo que me proteja do que eu desejo....

mas desejo. e contra mim não tenho forças. sinto-me invadida... delicio-me com tanta falta de decoro. são olhos que brilham no escuro que me buscam e mãos que me caçam e lábios que me mordem. decifra-me e devora-me.

terça-feira, 8 de junho de 2010

little wing

Lu Minami

Ouvindo: Billie´s Blues
(Billie Holiday)



Me fez chorar.
Ser lembrada do quão livres já fomos um dia.

Me fez cantar.
Lembrar de um diálogo com duas frases que já dizia tudo.

Me fez amar.
Saber que sempre estará ao meu lado, mesmo quando parece já ter me esquecido.

Nossas coisas viverão para sempre dançando enquanto não voltarmos para lá. Nossas conversas vão bailar um tango eterno, no passo certo e certeiro. Os sorrisos como uma valsinha. As ofensas que vão cirandar ao nosso redor.

Só você sabe o quanto tenho de coração, medo e coragem nessa vida. O coração só bate dentro da gente e tem vida própria. Não sei porque a gente insiste em aprisioná-lo. Dia desses, se torna selvagem, morde, machuca e sai correndo de dentro do nó do peito.

Puro esconde-esconde.
E sem chance de salvar o mundo.

terça-feira, 18 de maio de 2010

.rythm.&.blues.[e um olhar desconcertante]

ju mancin

d°_°b magical mistery tour, the beatles

[something in the way she moves

attracts me like no other lover

something in the way she woos me]

preciso de uma estória. minto! história. uma outra história, uma nova…

algo que diga mais ou menos que um dia eu tava ali parada, mergulhada na inércia de um beco escuro, cigarro aceso, café na mão direita, coração no canto esquerdo, batendo lento, fraco...

pois bem. quando a gente tá ali pasmando no beco escuro, a gente não espera que nada aconteça, que ninguém apareça.

então eu ali, parada no beco, fumando um cigarro e bebendo café, quase sem coração e esperando ninguém. ouvindo cada sussurro silencioso saído do lado de lá. pequenos fragmentos de vida lançando-se inocentemente pelas frestinhas das paredes das casas das criaturas que habitam o lado iluminado.

uma ou outra alma perdida que passa de tempos em tempos, pouco me chama a atenção. são apenas fragmentos de gente. mutiladas por suas vidas desinteressantes. por seus segredos mal guardados. por seus desejos repimidos. pequenos espectros infelizes em busca de um veneno qualquer, que ainda me atraem um pouco. ao menos encaram o lado negro em busca de um trocado…

desprezo todo o resto. as pessoas e suas salas de jantar. seus cachorros e suas filhas. suas casas, seus balaustres. suas pequenas heranças de família, que incluem apenas misérias humanas. mais um trago e sinto o sabor amargo de uma vida em sociedade. e nauseada tento afastar a lembrança dessa gente que vive pela metade, comendo uma saladinha pra matar a fome. infelizes os homens que perderam o paladar. desprezo-os, especialmente, porque entre seus bens tão valiosos não estão um vinil e uma vitrola. eles não sabem dançar…

tateio meus bolsos em busca de uma dose, só mais uma…

.

.

pequenas bailarinas flutuam em meio à fumaça e bem ali, diante dos meus olhos estarrecidos, me lembro de um mundo qualquer. onde eu vivo às vezes. colorido. sinto saudades de casa. do jardim. do cheiro de mato molhado, do balanço, e da música que parece sair da alma de um gênio com coração de menino. bailarinas-borboletas que sopram em minhas palpebras, pequeninas porções de ilusões, meus olhos se fecham, por horas, creio eu… aos poucos, e retomando a [in]consciência começo a pulsar vida, de dentro pra fora, o coração em choque parece querer gritar e bater. forte, descompassado e a razão, num último suspiro, arrisca um palpite, infeliz, do ponto de vista de minha conselheira insensatez…

segunda-feira, 17 de maio de 2010

.lupicínio.rodrigues.

ju mancin

 

d ¨-¨b nervos de aço, lupicínio rodrigues

 

 

Virada Cultural 2010.

#etenhodito

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Colorful

Lu Minami

Ouvindo: Happiness
(Goldfrapp)

Ela era uma escultora. Esculpia os sonhos ao seu redor para que tomassem forma enquanto cantava. Fazia daquilo a sua realidade, fazia o real se tornar uma esquete de amor próprio e de amor pela cidade. Ela era escritora. Ensaiava seus diálogos quase sempre definitivos, quase sempre inacabados. Ela parecia quase nunca ter razão nessas discussões, mas sempre terminava em um longo abraço como quem se despede para sempre. Ela era compositora. Buscava ritmos no seu andar, no seu amar e no seu sorrir. Ela era poeta. Andava descalça nas folhas caídas da calçada, trovava a dor de amar, a solidão de pagar contas e dirigir sozinha na madrugada. Ela era autista. Fechava o mundo fora do corpo e olhava para dentro de seus buracos, seus ocos, seus vazios... cantava baixinho e recitava poemas em silêncio com o olhar perdido. Ela era florista. Pintava as flores de vermelho e as entregava para qualquer coração pálido, colhia mudas nas entrelinhas de cada conversa pela metade e jurava regá-las até o fim. Ela era curandeira. Olhava a palma das mãos e tocava as pessoas com o real desejo de curar a si mesma. Ela era costureira. Sabia coser como ninguém seus remendos para enfiá-los num bolso furado e cobrir-se com um capuz puído. Ela era puta. Exibia seu corpo como quem leiloa um pedaço de carne meio fresco, meio passado. Ela cobrava o que oferecia em moedas de olhares e sorrisos. Ela era louca. Gritava, descabelava como ventania e ardia eternamente, sem tocar os pés no chão, sem tirar os olhos do céu e da chuva. 


Ela era o amor. 

Cheia de tudo e nada. 

Transbordada de coragem e esperança. 

.blasè.

ju mancin

d°_°b sobre o frio, supercordas

 

essa coisa que olha sem ver.

que quer sem querer.

que vai só por ir.

que ri sem notar.

que não ousa chorar.

nem amar.

terça-feira, 16 de março de 2010

.penhasco.

ju mancin

d°_°b god help the girl, god help the girl

 

“e apenas ser mais um na sua cama, por uma noite apenas

e nada mais”

meus pés descalços passeantes à beira do abismo parecem não se importar com o risco que correm. displicentes como quase tudo aquilo que me encanta, não se importam com o risco a que me expoem. meus pés descalços ansiosos por um pouso suave, parecem não notar o caminho de cascalhos que se trilha sob nós e parecem saber onde vão, embora eu saiba que eles sequer imaginam os perigos a cada vez que se lançam irresponsavelmente para a boca do precipicio.

minhas noites de sono são insônias delirantes.

passo o dia, quase sempre, sonhando acordada com pequenas verdades quase não-palpáveis.

numa daquelas certas manhãs em que se acorda de sonhos intranquilos, de sobressalto, sem saber se foi sonho ou realidade. sem saber se meu desejo é crime. se meu medo é fato. banhada em sentimentos. inebriada. penso em borboletas vermelhas feito sangue. penso em tristes e negras borboletas pairando sobre nós, ditando as regras de uma loucura tão lúcida quanto a das ditaduras. e em lindas borboletas roxas, que nos unem num desenho imaginário como cola invisível e que num toque de mágica, voltam a avermelhar-se em tom de sangue.

PERIGO! ALTA TENSÃO!!!

quinta-feira, 4 de março de 2010

je t’aime… moi non plus

ju mancin

d°_°b intoxicated man, serge gainsbourg

é que às vezes, na falta do que falar eu falo.

e outras vezes, quando há muito a dizer, eu calo.

hoje me contento com a música que canta aqui dentro, ao redor, em toda parte…

é como se sol brilhasse de dentro pra fora.

no meu silêncio tem saudade. tem vontade. tem muito mais que mentira e um toque sincero de verdade.

é como se meu silêncio fosse o mais puro dos versos impronunciáveis de um poeta maldito.

meu coração duro de barro seco, se desmancha por um poeta. da vila, do porto, do cais…

quanto vale meu segredo?

tenho mil razões para partir. só uma me faz ficar…

as paredes da nossa casa transparente, pintadas de verso e prosa e cores, que não fossem transparentes, nos rederiam um belíssimo pôr-do-sol!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Ensaio sobre a nossa preguiça

Lu Minami

Ouvindo: No one loves me & neither do I
(Them Crooked Vultures)

Caminhávamos por um desses caminhos estreitos cheios de barro e matos daninhos que podiam ou não irritar a pele. Naquele momento, a única coisa que irritava e ardia febril em mim era o seu andar lado a lado. Me incomodava muito essa coisa do caminhar juntos para a mesma direção, para viver junto por tempo determinado de antemão. Na verdade, não era o viver que me incomodava. Era a presença constante e enorme da sombra que você fazia em cima de mim e a minha, diminuta, que se projetava sobre seus olhos. Não podia vê-los mais. 


Hoje, o silêncio como companhia bastarda das nossas mãos entrelaçadas. Essa quietude de uma tonelada, abortada por não suportar viver dentro da gente, serpenteando por entre as pernas e em tudo o que faz cheiro na minha pele. E não há nada nessa caminhada que justifique a calma que sua respiração provoca. Nem porque meus olhos sempre fechados e insones ficam tão alertas quando percebo essa tranquilidade, esse sono. Presta atenção, eu não te amo não. Não por defesa, mas por preguiça. A preguiça estirada da tua sombra me livrando desse calor de matar o verão e os bichos que voam para morrer em nossa janela. Essa preguiça que dá sede e que a gente mata no copo transparente um do outro, encostado em portas de bar e em ruas sujas da nossa cidade castigada por essa chuva sem trégua, que barreia ainda mais toda a terra firme que eu juntei no meu peito por tanto e tanto tempo. Respiro. Uma preguiça imensa de dar forma, definir e tornar um algo único, feito pela minha e pela sua mão... uma preguiça tão grande que só me resta andar e andar até a próxima sombra, o próximo gole, o próximo verão.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Conversa com as paredes

Lu Minami

Ouvindo: Lulu's Back to Town
(Thelonius Monk)


É um demônio, esse.

Um desejo qualquer, para comer de colher.

Gruda na pele, nao sente, nao fala, nao cala, nao olha, nao tenta.

Vive em mim. Corre de mim.

Se esconde em canteiros de jardins. Erva daninha.

Urtiga.

Coceira sem fim.

Medo de arder.

Medo de colher [florescer].

Um ratinho sujo e sacana que se esconde aqui nos meus cantos.

Rói, rói... sempre andando na ponta dos pés e roubando tudo que me alimenta.

O doce que vem.

O amargo que sobra.

Rezo todo dia para ter perna e amor o suficiente para a despedida sem aceno.

E um sorriso de adeus. 



terça-feira, 5 de janeiro de 2010

.silêncio!, por favor.

ju mancin

d °_° b palavra de mulher, chico buarque

o amor é um cão dos diabos.

uma vaca do inferno. é um rinoceronte

que cospe fogo.

uma cobra que voa

e vomita veneno, do alto de sua intolerância

essa coisa move montanhas. cala histerias.

provoca tumultos. o amor é um manjar dos deuses…

o amor.

essa sopa rala que mal dá pra nós dois,

quiçá pra nós três [ou quatro]

de amor não tem nem o cheiro.

isso eu chamo de bursite, pedra no rim,

pancreatite, gases e outros demônios.

as vezes penso que tem saia

demais nesse varal.

perna demais pra pouca cabrocha.

isso que vocês chamam de amor

eu chamo de ejaculação precoce

o amor é outra coisa.

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