Ouvindo: Valsinha, Chico Buarque
Era verão e o calor abafado da cidade entrava pela janela de seu quarto. Atravessava as cortinas leves de musselina branca e invadia, num doce hálito, sua cama, por debaixo dos seus lençóis imaculados.
Cansada, levantou-se e pôs um vestido branco rodado, de rendas bordadas pela sua mãe que há muito partira, sem deixar rastro. Colocou as sandálias de corda e saiu pela cidade adormecida. O dia mal havia clareado e ainda havia orvalho nas mudas de romã, plantadas pela vizinha do lado.
Caminhou por entre pedras e galhos, trazidos pela chuva da noite anterior; por entre confetes e serpentinas rasgados pelo vento desolador e pelas pisadas da última romaria. De tão leve que seus pés chegavam ao chão, parecia estar dançando pela cidade deserta.
Quando chegou na praça da cidade, havia um seresteiro que cantava uma melodia triste e desafinada, solitário, com sua fantasia colorida já desbotada pelo maltrato do tempo. De longe, avistou um rapaz que também vestia branco e que andava sem rumo pela sombra das grandes mangueiras para fugir do calor que castigava aquela terra.
Os seus olhares se cruzaram. Primeiro, de maneira casual, quase sorrateira, por medo de rejeição ou de conhecimento antigo. Depois, de maneira tímida, como quem encontra o consolo há muito procurado. E assim caminharam, um em direção aos braços do outro, mesmo sem saber, sem querer. Quando chegaram mais perto, pararam um defronte ao outro. Ele conseguiu sentir o aroma dos cabelos negros daquela moça que tinha olhos amendoados e pele brilhante. Ela conseguiu sentir o calor do abraço daquele rapaz que tinha sorriso largo, cheio de dentes brancos e reluzentes.
O seresteiro os observou e tocou aquela canção, em que todos choram e gritam de tanto amor, mesmo sabendo que seu coração talvez não agüentasse ouvir aquela canção novamente.
Ele a enlaçou devagar, com cuidado e a tirou para dançar. Rodaram e acertaram os passos de uma dança suave e cálida, tão singela que todos saíram à janela para admirar. Dançaram com os olhos, as bocas e braços, enquanto o seresteiro cantava sua última canção.
De repente, do céu começaram a cair pétalas vermelhas. Devagar, uma a uma, preencheram o chão da praça daquela cidade que agora despertava. Enquanto a chuva aumentava, o casal que continuava a dançar, imaginou que uma revoada de borboletas temporãs passeavam pela cidade. O mesmo vento da noite anterior que soprou as flores vermelhas e suas pétalas desgarradas trouxe, no mesmo instante, gotas da chuva, pesadas e quentes que começaram a cair do céu.
A tempestade tingiu as roupas dela e dele e aquele rapaz possuía agora roupas vermelho sangue e sua bela acompanhante tinha seu vestido da cor do céu poente.
E assim dançaram para toda a cidade se lembrar daqueles que celebraram o amor da última canção do velho seresteiro.
Esse conto foi escrito em fevereiro de 2004, logo depois de uma 4a feira de cinzas em plena R. Augusta.
7 comentários:
E o seresteiro chama-se Rodrigo Amarante.
........
hj eu estou sem vontade de falar....
apesar de estar morrendo de vontade de ler algo aqui....( se soubesse o q fiz para conseguir um pc.......rrsrsrsrsrsrsr.....e tinha q ser hj, eu precisava disso)......não vou conseguir falar nada sobre o que li.
o dia está com mtas nuvens, e isso me atrapalha em sentir as palavras ou qq outra coisa.
bjoks
CARALHO.......
ALGUÉM PODE, POR FAVOR, ME EXPLICAR O MOTIVO DO CUIDADO QUE SE DEVE TER COM A MINHA PESSOA?
ESTOU AGUARDANDO VIU MENINOS....FALEM COMIGO, E ME DIGAM O MOTIVO ....
LÚ & JÚ
Mesmo meu nome não sendo Ysys, e vc´s sabendo bem pouco de mim, sou exatamente isso que estão conhecendo.
bjoks
acabei de passar em: julho, agosto e setembro de 2005
li:" a espera das coisas", "Ai, te esqueci" e "Minhas reticências"....
acho q estou entendo pq gosto tanto de passar aqui.
esse último texto me fez ter raiva de um tonto que me deixa sem nada em dias que preciso só dele.
mas....não quero falar sobre ele, e sim sobre os textos, são lindos meninas....
LINDOS
bom domingo!
mais bjoks
Passeios na Augusta são capazes disso? Caraca, e eu que pensava que Ágata Summer 120 paus a hora era tudo o que eu conseguiria...
Lindo texto. Fiquei com inveja.
hahahaahaha
Agata Summer.... adorei!
LU
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